Agora, talvez, eu aceite o fato de que escritor é sujeito a frequentes anseios.
Deparei-me comigo mesmo, caminhando inutilmente por entre os cômodos de minha casa na madrugada, ouvindo os ecos da noite e mantendo-me ocupado com as mínimas perdições — adiava o momento de ter que encarar a caneta, o papel, o teclado, o monitor.
Em matéria de preguiça, sempre fui destaque. Mas não é esta que me apavora, mas a ideia de se obter um resultado. Talvez um tipo novo de fobia, talvez algum psicólogo já a houvesse descoberto antes de eu achá-la em mim mesmo, em uma viagem interior ocasionada por mais de dez minutos da brancura inquietante de um documento em minha área de trabalho: vazio. E eu, copo na mão, postura incorreta, encarando sem piscar, na esperança que o turbilhão em minha mente se transcrevesse em um capítulo decente.
Não podia sentir o gosto de minha decepção, se pudesse, seria amargo. Ou metálico como o sangue que quase podia seguir a trajetória em minhas veias, tamanha era a sensação de estar inerte em mim mesmo.
Havia passado a viagem toda até em casa desta forma, imóvel, encarando a imensidão através do vidro da janela do carro no dia anterior. Sequer notei qualquer parada — porém acredito que houvéssemos parado, pelo tempo que me fez quase surtar em mim mesmo. Eu havia imaginado uma cena. Uma mulher caminhava resoluta por um corredor branco, de salto alto, com sua maleta em mãos. Eu sabia o que tudo aquilo significava. Eu tinha a personagem e conhecia seu final. Erro meu considerá-la humana em alguns minutos. Rir com ela, chorar com ela, ansiar por ela.
Agora o sono me consumia em lembrete da noite mal dormida que originara mais de cinco laudas à mão em um velho caderno escolar que pouco havia sido usado. E uma linha mal escrita agora suplicava uma pressão sucessiva no botão de apagar. Mas os únicos sons audíveis não eram os dos meus dedos nas teclas, mas os cães latindo ao escuro na rua quieta das três da manhã.
Rendi-me ao incrível bloqueio que a luz artificial me oferecia e imaginava-me ao ar livre com um bloco de notas em mãos. Talvez o ambiente me estivesse causando uma claustrofobia. Mas não abriria a porta de madeira rumo à brisa noturna — talvez a lua fosse a última coisa que eu quisesse ver naquela madrugada.
Ou talvez fosse o medo de mim mesmo, de ter de ler qualquer coisa que eu escrevesse.
Sim.
Meu medo era fazer, e fazer errado.
Ou pior ainda, fazer certo.
Eu temia o ato.
Escrever é um pesadelo quando não se tem inspiração.
Porém um mal necessário, deixar de lado o desamparo. E noites mal dormidas, estas eu conheço.
Era a primeira vez que a insônia era o medo de nunca mais usar o ponto final. Pois a angústia era ter que iniciar uma frase.
Momentos como este, se tornam comuns para nós, escritores. Mas, lendo tudo isto, escrito com tanto sentimento e detalhes generosos de seus passos pela casa e medo de si próprio, atrevo-me a dizer que havia inspiração sim, mas que esta não estava no lugar certo. Bom, mas de certa forma, acredito que este pesadelo começa a terminar quando aquela primeira frase confortante aparece escrita à sua frente. Sendo assim, durma um pouco, acorde melhor e na madrugada seguinte, abra a porta, respire aquele ar natural que abraça a casa e olhe pra lua. Talvez você com uma respiração forte tu se sintas melhor. A tal inspiração ficará feliz quando vier lhe visitar. Aposto nisso. E muito boa sorte pra ti nesse processo magnífico que é escrever.
ResponderExcluirSão momentos que pensamos não poder mais encarar um livro, ou uma folha de papel. Porém, felizmente, é uma crise passageira. ;)
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